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sábado, 5 de novembro de 2016

1 ANO



365 dias sem chão. Quando Zefa olhou com olhos tristes o que restou do seu lar, preferiu não acreditar. Mas estava ali: a sua vida devorada pela bocarra faminta do capital. Em pouco tempo não serás mais o que és. 365 dias atônita. A tristeza não sai nem que tu esfregue. Ela gruda na sua alma feito cola capeta, não dá sossego, amola os cornos cansados de tanto apanhar. Em cada esquina cai um pouco a tua vida. 365 dias insone. Em cada esquina a lembrança do que deixou de ser: da igreja acabada, a escola alagada, o bar soterrado, os amigos levados. A impermanência constante, longe de casa, estranho em ambiente familiar. Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos. 365 dias calado. Vai engolir sua firmeza, fincada em barro mole. Vai destruir os comprimidos que és obrigado a tomar, batendo na cabeça em vão. Vai te pegar pelos pés e pendurar em praça pública. O infinito remorso da devastação. Vai reduzir as ilusões a pó. 365 dias de revolta. O marido bêbado atirando pedras a transeuntes. A filha que chora em silêncio. O prazer perdido das pequenas coisas: a horta no quintal, o passeio de burro, a pelada na terra, a conversa jogada fora pela teimosia em existir. De cada crime tu herdarás só o cinismo. 365 dias insistindo. 12 meses de fibra, socando o vazio para exercitar, escolhendo arbitrariamente onde morar, esperando o direito que nunca vem, vendo a fonte secar, o empresário se safar, o político se esquivar, parte da imprensa atenuar, a comunidade persistir. Quando notares estás à beira do abismo. 365 dias de luta.

MINISTÉRIO DA VERDADE